Uma tese singularmente drástica da nossa modernidade, e contudo amplamente aceita e repetida como um lugar comum da época, afirma a inaptidão de todos os sistemas filosóficos, a impossibilidade das grandes sínteses do pensamento e a incapacidade em geral da razão para dar conta da realidade. Não é difícil imaginar porque é que esta tese tem tanta popularidade: os filósofos são muitos, os livros de filosofia são longos, pensar é cansativo e faz dores de cabeça. E depois, evidentemente, para ler Schopenhauer, é preciso recuar até Hume e a Kant; para ler Sartre, remontar a Heidegger, e não se pode chegar a Marx sem passar antes por Hegel, por Ricardo, por Feuerbach. Para se compreender Wittgenstein, é preciso saber lógica; para ler Vico, história; para abordar Santo Agostinho, teologia. Torna-se, é claro, muito tentador que então alguém nos convença com um bom argumento de que nada disto é necessário, que todos esses rapazes estavam enganados e que podemos passar sem perdas por cima desses três ou quatro mil livros.
Em vez de um bom argumento há um golpe de mão demasiado rápido: a crítica parte da afirmação de que a razão humana é limitada (o que, sem dúvida, é verdade e tão inovador como, por exemplo, dizer que os homens são mortais, ou que, embora agite os braços muito rapidamente, não levantaremos vôo) e, à laia de conclusão, põe de lado toda a história do pensamento, fazendo passar por impotência toda a sua limitação.
Borges e a Matemática
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